*escrito com Bruno Ferreira
O modelo básico de desenvolvimento adotado pelo estado chinês foi: transferência tecnológica do ocidente como troca por acesso ao mercado interno e mão de obra barata. Um modelo simples e efetivo! O caso dos trens ilustra de maneira cristalina como tudo isso funciona. A empresa estatal chinesa e maior fabricante de trens mundial chamada CRRC (China Railway Rolling Stock Corporation) vem em período de constante crescimento na última década e era praticamente desconhecida na indústria ferroviária global há 20 anos atrás. O crescimento contínuo da CRRC é considerado por muitos como um “erro” cometido pela Alstom, Siemens, Bombardier e Kawasaki. No início dos anos 2000, a China comprou mais de 1000 trens, de cargas e de transporte de passageiros, de alta velocidade destas quatro empresas em negociações que totalizam aproximadamente 4 bilhões de libras. E para abastecer essa quantidade alta de trens, todos tiveram que assinar contratos de joint venture com duas fabricantes estatais chineses, a CSR (China South Railway) e a CNR (China North Railway). Os contratos feitos pelas empresas possuíam termos de transferência de tecnologia que permitiam que as empresas chinesas utilizassem a propriedade intelectual usada nos trens fornecidos e exigiam que uma quantidade do total de trens produzidos, fossem feitos na China, o que permitiu que as empresas estatais se beneficiassem do capital, treinamento e tecnologia usados pelos fabricantes de trens mais avançados da época, aumentando assim sua capacidade produtiva e a capacidade de desenvolver seus próprios trens chineses semelhantes.
A China fez com que sua demanda por trens de alta velocidade aumentasse enquanto derrubava o mercado para concorrentes internacionais, e para ajudar a acelerar o crescimento da CRS e da CNR, a China permitiu que eles se beneficiassem de economias de escala. Isso fez com que se criasse um duopólio entre a CRN e a CRS, forçando as duas empresas a competirem entre si pelos concursos domésticos chineses e incentivando-os a inovar e melhorar as suas tecnologias ferroviárias. As duas empresas se fundiram para formar a CRRC em 2015, criando um gigante do setor ferroviário, que permitiu a China a competir com os seus antigos fornecedores de licitações no exterior. Desde então, a CRRC desenvolveu um extenso portfólio de trens de sucesso e concluiu projetos em mais de 100 países, cada um valendo de 100 milhões de libras a 1 bilhão de libras. O crescimento contínuo da CRRC e uma infinidade de realizações agora representam um risco para a concorrência no mercado ferroviário global? A CRRC é muito maior que a Alstom, a Bombardier Transportation e a Siemens (que são a segunda, terceira e quarta maiores fabricantes de veículos ferroviários) quando combinadas pela receita mundial. A concorrência acusa a CRRC de explorar o poder de monopólio usando preços predatórios (oferecendo propostas para projetos de baixo custo) para garantir propostas. A CRRC venceu muitos contratos vencendo os concorrentes por grandes margens, por exemplo, a empresa ganhou 465 milhões de libras em licitações para fornecer trens para o metrô de Boston, boicotando a Bombardier em 50%. Além disso, 90% do comércio da CRRC está na China, pois a estrutura do país responde a dois terços do comprimento total mundial de linhas ferroviárias de alta velocidade, portanto, a empresa teve diversas oportunidades para corrigir seus erros e desenvolver sua própria tecnologia antes de ir competir nos mercados com os estrangeiros. . A empresa também se beneficia de economias de escala internas e externas inigualáveis por seus rivais, devido ao seu nível de produtividade e o emprego da mão-de-obra barata chinesa e a sua proximidade com seus fornecedores. No entanto, a maior potência da CRRC é a colaboração que possui com bancos estatais na China, permitindo a concessão de empréstimos para projetos ferroviários no exterior, mas só é autorizado a concessão se os projetos forem concluídos pela CRRC. Diversas nações pobres (principalmente na África e no sudeste Asiático) se aproveitaram desses empréstimos para financiar o desenvolvimento da infraestrutura ferroviária em vez de usar seus próprios fundos governamentais, o que impede os rivais da companhia de competir por esses projetos. A CRRC reportou em 2019 uma receita de 229 bilhões de Renminbis, um aumento de 4% se comparado com 2018, onde reportou a receita no valor de 219 bilhões.
https://www.crrcgc.cc/en/g5251.aspx
https://www.crrcgc.cc/g5141.aspx
“Abrindo os olhos com a China”: Esse singelo artigo, de 2011, com exemplo portuário, trata de tema similar. https://www.portogente.com.br/colunistas/frederico-bussinger/39063-abrindo-os-olhos-com-a-china.