Café é Malthus, capsula é Schumpeter: a pobreza da cadeia brasileira do café

*escrito com Rodrigo Medeiros

O saco de café de 60 kg que sai do Brasil a R$400, R$6,6 por quilo, transforma-se numa cápsula de R$400 por quilo no varejo. Esse preço final remunera a construção de uma incrível fábrica de capsulas na Alemanha e gera um fluxo de salários e produtividade lá fora bem maior do que aqui, afinal, a cápsula é exportada para o Brasil e vendida por um preço 60 vezes maior do que o preço de exportação do café. Segundo Reinert (2016), países especializados em atividades malthusianas permanecerão pobres e com elevada concentração de renda, enquanto países especializados em atividades schumpeterianas serão capazes de elevar o nível de seus salários e atingir padrões de vida maiores. Do ponto de vista da sustentabilidade ambiental, a especialização malthusiana é perigosa porque ela está vinculada a rendimentos decrescentes de escala, a círculos viciosos de pobreza, a grandes pressões sobre os recursos naturais e a uma baixa produtividade. Destacamos a preferência de Lin (2009), ex-economista-chefe do Banco Mundial, pela adoção de uma estratégia de desenvolvimento guiada por vantagens comparativas, na qual a política industrial é inteligentemente utilizada pelo governo para coordenar as firmas de diferentes indústrias e setores para uma contínua atualização (upgrading) tecnológica e industrial. Seguindo essa estratégica gradualista, o governo deve ainda investir em infraestrutura e fortalecer as instituições voltadas para o desenvolvimento econômico e social. Seguindo essa lógica, tende a ser mais eficiente buscar trabalhar a partir das estruturas produtivas vigentes para buscar coordenar e induzir a atualização tecnológica e industrial ajudando as empresas domesticas a romper as barreiras de concentração de mercado impostas pela posição dominante de países ricos em mercados de maior nobreza tecnológica. Esse o caminho para o desenvolvimento econômico.

ótimo texto sobre o tema: cafe_uallace_moreira

Referências bibliográficas

ARGAWALA, A. N.; SINGH, S. P. (orgs.) A economia do subdesenvolvimento. Rio de Janeiro: Contraponto, 2010.  

BAIROCH, P. Economics and world history. Chicago: University of Chicago Press, 1995.

BRESSER-PEREIRA, L. C. Em busca do desenvolvimento perdido. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2018.

FINDES – FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO ESTADO DO ESPIRITO SANTO. Boletim Econômico Capixaba. Vitória (ES): Findes, janeiro de 2020.

GALA, P. Complexidade econômica. Rio de Janeiro: Contraponto, 2017.

GALA, P.; RONCAGLIA, A. Brasil, uma economia que não aprende. Rio de Janeiro: Contraponto, 2020.

GALBRAITH, J. K. O pensamento econômico em perspectiva. São Paulo: Pioneira, 1989.

HARTMAN, D.; Jara-Figueroa, c.; Guevara, m.; Simoes, a.; Hidalgo, c. The structural constraints of income inequality in Latin America. Integration & Trade Journal. No. 40, June 2016.

HAUSMANN, R.; HIDALGO, C.; BUSTOS, S.; COSCIA, M.; CHUNG, S.; JIMENEZ, J.; SIMÕES, A.; YLDIRIM, M.A. The atlas of economic complexity. Hollis (New Hampshire): Puritan Press, 2011.

HIDALGO, C. Why information grows. New Youk: Basic Books, 2015.

IEDI – Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial. América Latina: exportações em queda. São Paulo: Iedi, 26 de maio de 2020.

KRUGMAN, Development, geography, and economic theory. Cambridge (MA): The MIT Press, 1995.

LEVITSKY, S.; ZIBLATT, D. Como as democracias morrem. Rio de Janeiro: Zahar, 2018.

LIN, J. Y. Economic development and transition. Cambridge (UK): Cambridge University Press, 2009.

OLIVEIRA, U. J. Elites capixabas no golpe de 1964. Serra (ES): Editora Milfontes, 2018.

PIKETTY, T. Capital e ideología. Barcelona: Editorial Planeta, 2019.

REINERT, E. Como os países ricos ficaram ricos… e por que os países pobres continuam pobres. Rio de Janeiro: Contraponto, 2016. 

ROCHA, H.; MORANDI, A. Cafeicultura e grande indústria. Vitória (ES): Espírito Santo em Ação, 2012.

RUNCIMAN, D. Como a democracia chega ao fim. São Paulo: Todavia, 2018.

UNCTAD – UNITED NATIONS CONFERENCE ON TRADE AND DEVELOPMENT. State of commodity dependence 2019.  New York: United Nations, 2019.

WORLD BANK. World Development Report 2009. Washington (DC): World Bank, 2009.

3 thoughts on “Café é Malthus, capsula é Schumpeter: a pobreza da cadeia brasileira do café”

  1. Compartilhei o texto na minha página do Facebook. Tomei a liberdade de fazer uma alteração em uma parte do título:” ….a pobreza da cadeia brasileira do café”, ao invés de “a pobreza da cadeia do café brasileira”,

Deixe uma resposta