Argentina #TBT. A inflação na Argentina corre a mais de 50% ao ano, a economia caminha novamente para uma indexação informal em dólares com risco até de hiperinflação. O déficit em conta corrente está na casa 4%, a produção industrial caiu 6% no primeiro semestre de 2019 e o PIB deve fechar o ano em queda relevante. Com reservas na casa de U$60 bilhões e uma dívida externa de mais de U$250 bilhões não haverá solução sem ajuda do FMI. O plano de Macri era privatizar o que restou na economia e reduzir o papel do Estado. O caso de Aerolíneas é típico: tinha monopólio nos anos 90, foi privatizada por Menem e reestatizada por Cristina; Macri não a reprivatizou, mas acabou com o monopólio nos voos abrindo os céus para as low-cost, inclusive as estrangeiras. Ao controlar gastos públicos e liberalizar e economia esperava uma “chuva de investimentos” que não vieram. Acabou cumprindo pouco do que prometeu e não mostrou resultados relevantes na economia.
A situação que já era grave se deteriorou ainda mais. O plano Macri era basicamente repetir a fórmula Menem/Cavallo agora na versão câmbio flutuante. Depois da bem sucedida implantação da caixa de conversão e do programa de estabilização com forte crescimento no início dos 90, o câmbio real argentino se apreciou muito, especialmente após o fortalecimento do dólar na segunda metade dos 90 e da desvalorização brasileira em 1999 a arrastou a Argentina para grande crise.
No final de 2001 as taxas de juros pagas pelos títulos da dívida externa Argentina se aproximavam de 50%, bem parecido com o caso grego. Após divergências com Menem, Cavallo havia voltado para o governo com De La Rua em 2001 para tentar consertar os erros do plano de conversibilidade que mergulhara a Argentina numa recessão.
A moeda estava sobrevalorizada e a economia totalmente parada. As políticas adotadas para sair da recessão foram as de corte de gastos públicos e austeridade, que levaram a uma queda dos salários nominais e reais (nos setores público e privado); as políticas de “confidence bulding”. Para evitar o estouro da ancora cambial a argentina conseguiu U$40 bilhões no FMI, que também não foram suficientes. Os pacotes de privatização e cortes de gasto não adiantaram. No final de 2001 a crise econômica provocou uma crise política que acabou com o governo de De la Rua, e levou a que passassem três presidentes interinos em quinze dias, até ser montado o governo provisório de Duhalde. No início de 2002 veio uma desvalorização bombástica que iria jogar a economia na lona.
O caos se instalou abrindo espaço para a eleição de Nestor Kirchner em 2003. Kirchner acertou no princípio e conseguiu promover uma robusta recuperação de atividade e emprego, renegociando a dívida externa com uma significativa redução dos montantes devidos (um corte de aproximadamente 70% da dívida). Errou, entretanto, quando demitiu o ministro R. Lavagna, hoje em terceiro lugar na disputa presidencial. A partir dali, ele e sua mulher e sucessora Cristina começaram a fazer erros grotescos como a mudança da equipe do Indec para recalcular a inflação que indexava títulos públicos para baixo. Ali começou novo descontrole inflacionário e a perda da credibilidade da política econômica.
Os erros argentinos de sobrevalorização da moeda que levaram a grandes déficits em conta corrente que por sua vez levaram a crises de desvalorização e inflação lembram a ancoragem cambial praticada no Brasil dos anos 1990 e no México do final dos 1980. Fruto de uma âncora cambial para acabar com a inflação implantada em 1987, o peso mexicano sofreu sobrevalorização e depois violenta desvalorização em Dezembro de 1994. Em janeiro de 1995, 9.000 companhias mexicanas faliram e mais de 1 milhão de mexicanos foram demitidos. O empréstimo de 20 bilhões de dólares oferecido pelos EUA não foram suficientes. Foi a crise da Tequila. No Brasil a conta da sobrevalorização da moeda nos anos 1990 chegou com a grande desvalorização de Janeiro de 1999. Chegava ao fim nossa âncora cambial implantada em Julho de 1994 para ajudar na estabilização de preços do plano real. Depois de algum crescimento, nossas contas externas saíram do controle. O endividamento em moeda estrangeira explodiu e passamos a sofrer recorrentes ataques especulativos contra o real. Nossos juros dispararam e o governo brasileiro da época passou a usar a SELIC nas alturas para tentar segurar a fuga de capital. Não funcionou também.
A Argentina representa um caso paradigmático na América Latina do padrão de sobrevalorização cambial e crise desde os 90. As previas de Agosto para a eleição aceleraram algo que já não vinha bem e agora a tensão financeira deve sacramentar a derrota de Macri. O novo governo devera acenar para o centro, mas essa nova crise da Argentina veio para ficar e vai, claro, atrapalhar o Brasil que também passa por enormes dificuldades.







otimo texto sobre o tema!
Argentina, o caso típico do feitiço virar contra o feiticeiro, ou seja artificialmente valorizaram o peso, uma festa de importados baratos, cuja duração vai até onde vai a corda dos juros elevados e aumento da dívida, até arrebentar, mas aí a produção interna já está lá em baixo e com a dívida o Estado perde a possibilidade de fazer investimentos para ativar a economia e tudo vai parando. Muitos economistas davam a essa receita para debelar a inflação, mas agora estão mudos.
John Kennet Galbraith que foi secretário de Kennedy e escritor do livro sobra a guerra fria, A Era da Incerteza, dizia que havia 4 economias no mundo , a capitalista, a comunista, a do esquimó e a Argentina. Difícil entender que um país com extensão territorial, riquezas minerais, proteínas, população alfabetizada como se meteu em atoleiro permanente. Parte acredito se deve ao sindicalismo de estado implementado por Perón, e que permanece enraizado até hoje, mas existe algo de muito estranho, para um país que tinha tudo para ser uma Austrália ou um Canadá !! … vai ter que procurar e desenterrar esse sapo … mas excelente laboratório para economistas …