*escrito por Luís Felipe Giesteira
Carrara, carioca de família ítalo-baiana, residente em Brasília por mais de 40 anos, era antes de tudo brasileiro. Jovem brilhante, passou pelo colégio militar do RJ, depois pela UFRJ, onde cursou Engenharia Química, ingressou no serviço público via Petrobrás, sempre aprovado entre os primeiros colocados. De lá foi convidado a integrar a equipe do antigo MIC, e a seguir do CDI, em meados dos anos 70. Carrara pertenceu a uma classe de profissionais que praticamente não existe hoje, a dos construtores anônimos do país, membros da alta burocracia profissional que ascenderam pela ascensão meritocrática combinada com empreendedorismo. Dela também faziam parte, entre outros, Cesar Peluso, Divonzir Guzzo, João Paulo dos Reis Velloso, Luiz Augusto Pontual, Casemiro Montenegro, Luiz Fernando Tironi, Renato Archer, Álvaro Alberto, Antônio José Roque da Silva, Ozires Silva, Hélio Beltrão, Luiz Milton Veloso. à causa do desenvolvimento, aos “boêmios cívicos” de Vargas, mas deles se diferenciam por terem ingressado por concurso público (o que quase sempre fazia deles fanáticos pela meritocracia). Boa referência para conhecer seu modus operandi são as obras de Codato (Sistema estatal e política econômica no Brasil pós-64), de Schneider (Burocracia Pública e Politica Estatal) e de Motayama (Prelúdio para uma História: Ciência e Tecnologia no Brasil). Recentemente há um interessante debate sobre capacidades estatais, tanto no Brasil quanto nos EUA e outros países da OCDE.
É muito bem vinda. Mas intuo que não daria conta da importância da contribuição desses construtores. Eles estariam para os policy makers que cumprem adequadamente critérios de desempenho basedos em “best practices” assim como os inovadores schumpeterianos estariam para um gerente de compras de uma corporação privada. De outra forma, divago que os burocratas construtores são os servidores públicos correspondentes ao que Chalmers Johnson chamou de “Estado Desenvolvimentista”, ao passo que nossos atuais gestores públicos de elite, são excelentes cumpridores dos manuais da OCDE e do BIRD, correspondem ao “Estado Regulador” de Johnson. Ambos são ótimos: estes para manter tudo sob ordem, aqueles para desenvolver países atolados em atraso. Nunca vi Carrara se definir como um “desenvolvimentista”. Ele olhava com curiosidade de menino esse debate. Pare ele, as empresas, a livre iniciativa era uma força crucial para o desenvolvimento. Para ele, o Estado era outra força crucial. Perguntado sobre qual é mais importante, ele provavelmente responderia “não dá pra os dois estarem juntos”? Seria equivalente a perguntar se seu Flamengo devia entrar em campo sem goleiro ou sem atacante. Carrara admirava a China e os EUA, Simonsen e Delfim, Furtado e Bulhões. Era-lhe muito difícil sequer entender as dicotomias em que os economistas gostam de se engolfar.
*faleceu em 5/Jul/2020
Grande Ernesto! Conheci brevemente no mesmo ano em que faleceu. Trouxe-nos um livro, objeto da sua pesquisa genealógica que perpassava por nossa cidade. Brilhante e generoso, contou-nos a história de Mata de São João e nos presenteou com edições do livro. Tinha muito interesse em editar novas cópias, pela Câmara Municipal – que fui Diretor -, mas, infelizmente, ele veio a falecer antes de disponibilizar o arquivo. Perdemos um grande construtor! Tenho seu livro físico e, se depender de mim, anônimo, ao menos em Mata de São João, ele não será.