O desafio da reindustrialização do Brasil

*escrito por Felipe Augusto

Politicas industriais para reindustrialização são extremamente complexas. São afetadas por muitos fatores, levam tempo e são arriscadas, exigem muitos dados e informações, nem sempre disponíveis, e requerem servidores públicos motivados, capacitados e experientes. Acima de tudo, defrontam-se com resistências poderosas, pois seu objetivo último é transformar a estrutura produtiva vigente, entendida como insuficiente para gerar desenvolvimento econômico. Completa-se o quadro desafiador com a fragmentação das ações e de instrumentos em vários órgãos e entidades, com capacidades desiguais e interesses diversos, acentuados pelas necessidades do presidencialismo de coalizão.

Os EUA criaram um órgão diretamente ligado ao Presidente Roosevelt para ajudar a vencer a 2ª Guerra, gerando novas tecnologias e contribuindo decisivamente para a criação dos ecossistemas de inovação do país. Na Coreia, o Presidente Park Chung-hee criou o Economic Planning Board para planejar a industrialização do país. Tinha status supraministerial, estrutura robusta, carreira própria, ligação direta com a Presidência, controle sobre o orçamento e representantes em outros órgãos. Na China, a Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma (NDRC) é um Departamento do Conselho de Estado com status supraministerial. A NDRC unifica o planejamento e coordena a implementação das políticas industriais chinesas. Como reação à ascensão chinesa, Biden elevou o status das políticas de desenvolvimento nos EUA. Deu status de Ministério ao Escritório de Ciência e Tecnologia e designou seus assessores econômico e de segurança nacional como coordenadores da principal agenda industrial.

Mas só hierarquia e priorização são insuficientes. Excelência técnica e autonomia são outros fatores primordiais. Nos anos 1950, JK tinha convicção na agenda de desenvolvimento, mas apenas 12% dos servidores da Administração Pública Federal eram concursados. Soma-se a isso a coalizão política heterogênea de JK, que ia do PTB (operário e de classe média), passando pelo PSD (classe média urbana e elites industriais) até a UDN (União Democrática Nacional, elites rurais e urbanas). Assim, para implementar seu ambicioso Plano de Metas, JK criou os chamados Grupos Executivos, encarregados do planejamento setorial, com autonomia de gestão e formados pelos servidores qualificados das principais agências responsáveis pela oferta e utilização dos incentivos. Era a chamada Administração Paralela. Dadas as limitações da época, a ação pode ter feito sentido, mas nada substitui a formação, a capacitação e a valorização continuada de servidores de carreira, como mostram bem os casos asiáticos.

O Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), que evoluiu do PAC, é uma inovação notável. Vinculado ao centro de governo (Casa Civil), possui 43 cargos de alto escalão para atrair os melhores profissionais. Mesmo assim, apenas 35% são exclusivos para servidores de carreira. Autonomia, portanto, é fundamental, mas não pode ser confundida com isolamento. O Estado precisará de dados e informações do setor privado e da sociedade civil, assim como do seu apoio para a aumentar a legitimidade política de suas ações. No Japão, eram famosos os Conselhos Deliberativos. Por meio deles, servidores públicos realizavam intercâmbios sistemáticos com empresários para subsidiar as políticas públicas. Porém, não tinham caráter decisório e respondiam a Departamentos dos Ministérios.

Diante disso, é fundamental que a tomada de decisões seja realizada pelo mais alto nível de governo. Um “Conselho de Ministros” com a participação do Presidente da República pode trazer ao mesmo tempo autoridade, legitimidade democrática e maior autonomia. Um modelo que pode ser seguido é o da mais alta instância da Câmara de Comércio Exterior dos EUA. Nessa linha, os EUA pretendem criar um Comitê de Ministros para construir estratégias nacionais de desenvolvimento a cada 4 anos. Reindustrializar é um desafio extraordinário. Reorientar o Estado para essa tarefa é um passo indispensável para recolocar o Brasil no caminho do desenvolvimento.

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