*escrito com um especialista que preferiu não ter seu nome divulgado
Segundo o Secretário Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do Ministério da Economia, Salim Mattar, a empresa deu prejuízo de R$ 12 milhões em 2019 e, desde que foi criada em 2008, o governo teria investido R$ 907 milhões, sem retorno. O setor de semicondutores é considerado estratégico em todo o mundo. Chips formam a base de praticamente todas as tecnologias cruciais do futuro, como inteligência artificial, robótica, carros autônomos e internet das coisas. Está no centro da guerra tecnológica entre as duas maiores potências do mundo, China e Estados Unidos. Para atrasar e até bloquear o avanço da Huawei na tecnologia 5G, os EUA restringiram o acesso da empresa a insumos que contenham tecnologia americana. O maior gargalo? Semicondutores. A TSMC, empresa taiwanesa que se tornou referência na fabricação de chips, é cobiçada pelos dois países. Na China, fala-se inclusive em invadir Taiwan para assegurar o fornecimento regular dos chips (https://chinatalk.substack.com/p/huawei-banned-so-lets-invade-taiwan). Trump, por outro lado, aproveitando-se da rivalidade entre Taiwan e China, pressionou a TSMC para que ela construísse uma planta de chips no Arizona (https://t.co/U4xbM2xbiP?amp=1).
O problema é que produzir semicondutores é muito difícil. A curva de aprendizado é longa. O setor é um dos mais intensivos em pesquisa e desenvolvimento e o montante de investimento requerido, sem retorno garantido, é muito elevado. Nesse sentido, as pioneiras levam muita vantagem sobre as retardatárias. Pioneiras que, como Intel, Samsung e TSMC, beneficiaram-se enormemente do Estado, seja por meio de compras governamentais (especialmente a Intel, em decorrência da demanda dos complexos aeroespacial e militar americanos), seja pela concessão de empréstimos subsidiados (com destaque para a Samsung), seja pelo investimento público em pesquisa e desenvolvimento (TSMC é um spin-off do Industrial Technology Research Institute de Taiwan)
O quadro abaixo mostra como é difícil para empresas retardatárias reduzirem a distância em relação às pioneiras. Neste setor, quanto menor for o tamanho do nódulo, mais avançado ele é tecnologicamente. As duas últimas são empresas chinesas, estatais, mais antigas do que a brasileira CEITEC e que receberam investimentos muito maiores, mas que mesmo assim continuam atrasadas tecnologicamente em relação às líderes do setor. Pelo menos desde 2011, com a Circular Nº 4 do Conselho de Estado (Several Policies for Further Encouraging the Development of the Software Industry and Integrated Circuit Industry), o setor é considerado estratégico para o futuro do país. Em 2014 foi criado o China Integrated Circuit Industry Investment Fund Co., Ltd, com recursos da ordem de US$ 23 bilhões. O Plano Made in China 2025 estabeleceu como objetivo atingir 40% de autossuficiência em chips até 2020 e 70% até 2025. A real magnitude do apoio governamental chinês ao setor de semicondutores é difícil de mensurar, pois envolve uma série de instrumentos e não se caracteriza por ser transparente. Mesmo assim, a OCDE calculou estimativas para 21 empresas.
Segundo a OCDE, todas as empresas de semicondutores analisadas receberam apoio governamental entre 2014 e 2018. A chinesa Tsinghua foi a que mais recebeu, seguida da Samsung, da Intel e da TSMC. Em relação à receita de cada uma, destacam-se as chinesas. SMIC e Tsinghua, por exemplo, receberam suporte equivalente a mais de 30% da sua receita no período. Hua Hong e JCET vieram na sequência. Aportes de capital do governo chinês de 2014 a 2018 aumentaram significativamente os ativos das empresas do país. Porém, as respectivas margens de lucro continuaram muito menores do que as das demais empresas da amostra, apesar do forte apoio governamental.
Segundo a OCDE, empresas chinesas se destacam entre aquelas que não conseguem gerar lucro suficiente para cobrir o custo do capital. Ademais, à esta altura já está claro que os objetivos do “Made in China” não serão atingidos. Tais resultados abalaram a confiança dos chineses? Fizeram com que eles desistissem de desenvolver semicondutores? Os chineses liquidaram suas estatais porque “oneram o cidadão”? De forma nenhuma. No ano passado, a China criou um novo fundo, agora com US$ 29 bilhões (maior do que o de 2014), para o país ficar menos dependente dos EUA em semicondutores. No auge do rigoroso lockdown imposto sobre Wuhan devido ao COVID-19, a empresa Yangtze Memory Technologies, produtora de chips de memória, tinha vagões de trem reservados para funcionários da empresa e supervisionados pelo governo para poder continuar funcionando, enquanto o resto da cidade estava parado (https://t.co/mQcKzF4AhW?amp=1). Somente no mês passado, o governo chinês injetou US$ 2,2 bilhões na SMIC, muito mais do que a CEITEC recebeu do governo brasileiro em toda a sua existência (https://www.scmp.com/tech/big-tech/article/3084760/china-injects-us22-billion-local-chip-foundry-smic)
O domínio desta tecnologia é considerado crucial ao desenvolvimento chinês. A elite do país considera que não há outra opção. Por mais custoso e frustrante que possa ser o desenvolvimento deste setor na China, não há outro caminho possível para o país se tornar uma potência. Tem país que tem ambição de se desenvolver. Outros se contentam em vender soja e minério de ferro e continuar sendo colônia para sempre.
o que e’ um semicondutor?
https://queconceito.com.br/semicondutor
Relatório da OCDE: https://www.oecd-ilibrary.org/docserver/8fe4491d-en.pdf?expires=1591878821&id=id&accname=guest&checksum=94BA41B4053432D277F85490DC038EA6






grato pelo seu texto/pesquisa….. me pergunto com sair dessa situação : reciclar 95 % da classe política será(ia) a solução mas como fazê-lo em um país com essa dimensão….https://www.wsj.com/articles/lawmakers-propose-spending-billions-to-strengthen-u-s-chip-industry-11591825784
Para desenvolver semicondutores, é necessário o domínio de tecnologias de óptica e mecânica finas, que não temos. A produção de chips no Brasil, limitou-se a importar os waffers e montar o chip no Brasil, sem dominio da fabricação dos waffers…
Temos que investir nas nossas vantagens competitivas: minério, café, soja, bananas…
Complexo colônia
Eu cresci, vivi e sobrevivi para presenciar muita situação no decorrer da história do país, que me leva a crer cada vez mais, que não saímos do lugar. Salvo, o retorno ao passado inserido num presente que não existe. Existe sim, um passado mal digerido que insiste em ficar e continuar a provocar náuseas e mal estar entre a população, segmentando a sociedade num grande museu. O presente está do lado de fora deste museu, tentando reinventar e fazer novos trajetos onde a esperança faça parte do futuro da nação. O museu fechado está e não permite encarar o presente que bate à porta. Para muitos, isso até rejuvenesce, pois algo do passado, não foi lido, interpretado ou por conta do sistema, a alienação levou à vedação de todas as portas do museu, e o presente, e muito menos o futuro, não têm acesso à esse ambiente. Não se projeta um futuro sem que haja esperança em olhar o presente com o olhar firme aos obstáculos que nos prendem sempre e cada vez mais, ao passado. Então, a alienação é um anestésico para a mente a para a alma do cidadão, onde os mortos não existem e os vivos, enterrados estão. A engrenagem do desenvolvimento econômico segue a rota do complexo colônia, onde o extrativismo continua o reinado sem um rei com comando firme que incentive o investimento no seu potencial interno. Vende-se tudo e se fechar os olhos, se toma.
Sydia Araújo
Excelente texto. Penso o mesmo a respeito, mas não seria capaz de uma síntese tão acurada da situação. Estamos fadados ao extrativismo se não mantermos os olhos abertos.
Análise perfeita, parabéns !
Muito interessante suas reflexões a respeito do mercado de semicondutores e suas implicações para o desenvolvimento de un pais. De fato, além de atender o interesse de muitas empresas, pois permite otimizar a produção em uma disputa internacional por mercados, também essa tecnologia é fundamental para sa soberania dos países citados. O Brasil segue atendendo aos interesses do rentismo, do agronegócio e do capital estrangeiro. Somos um país dependente que não dispõe de tecnologia para disputar o mercado global. Nosso crescimento econômico foi baseado em crédito, comodotites e consumo. Não houve um desenvolvimento estrutural da economia brasileira. Surge a seguinte questão: por que não nos desenvolvemos como a China? Por que estamos ainda submetidos a variação dos preços de comodotites? Em pleno século XXI, o Brasil se destaca nesse aspecto. Ao contrário da China, o Brasil segue com sua política costumeira de conciliação. Os chineses fizeram uma revolução. Até para desenvolver o capitalismo é necessário uma revolução. Não há como tergiversar sobre essa questão. Os chineses não esperaram por eleições democráticas. Se tivessem optado por esse caminho, seguindo o consenso de washington, seriam apenas mais uma república de bananas. Optar pela democracia liberal é atender os interesses de uma elite atrasada em parceria com o capital estrangeiro.