Vivemos ainda um superciclo de expansão de liquidez por conta das respostas à crise de 2008. Um ciclo que sucedeu o ciclo de Greenspan turbinado pela redução das taxas de juro no rescaldo do estouro da bolha pontocom. Além disso houve no inicio dos 2000 a reciclagem dos superávits asiáticos, especialmente China, reinvestindo seus capitais em títulos americanos, jogando as taxas longas ainda mais para baixo. Esse “ciclo Greenspan” acabou na quebra da Lehman Brothers em 2008. No terremoto seguido de tsunami, que todos nós sofremos. A rigor a crise americana começou no final de 2007. No final desse ano o preço dos imóveis começava a se estabilizar e até cair na margem. Alguns calotes em hipotecas e pequenos bancos começavam a chacoalhar. A subida de juros de Bernanke alguns meses antes estava contribuindo para esse “saudável ajuste” da farra de crédito dos últimos anos. Só que o ajuste começou a se tornar uma bola de neve sem tamanho. O primeiro grande golpe foi a quebra da Bear Sterns, socorrida pelo FED e JP Morgan. Depois vieram Freddie Mac e Fannie Mae, AIG e por fim a bomba nuclear da Lehman Brothers. O governo americano foi fazendo de tudo para tentar evitar o colapso, mas no caso final da Lehman não foi feliz. Enquanto isso nos mercados de títulos e equities a tensão começou a aumentar depois que o BNP fechou dois fundos para resgate em 9 de agosto de 2007. Para muitos a data oficial do início da crise de 2008. De lá para cá todos nós já conhecemos a história. Os bancos americanos foram caindo numa seqüência de dominós. Os mercados de ações começaram a ceder e derreteram no segundo semestre de 2008. Os mercados de empréstimos interbancários travaram e as taxas de juros explodiram. Os BCs entraram em cena para socorrer emitindo trilhões de dólares e de euros. A atividade econômica despencou e o desempregou voou. O clássico script de uma mega crise de desalavancagem seguida de um período de expansão hercúlea do crédito.
No final de 2009 e primeiro semestre de 2010 veio ainda uma segunda rodada da crise, graças à novidade da união monetária do EURO. Se os países fracos da região não estivessem atrelados ao Euro suas moedas teriam se desvalorizado com violência e os governos frágeis teriam poder limitado para fazer gasto público estimulante. Grécia, Irlanda, Portugal e Espanha teriam quebrado bem antes. Só que o arranjo do Euro acabou dando uma sobrevida para esses países. E finalmente no primeiro semestre de 2010 veio a segunda rodada da crise, com ameaça de ruptura de toda a região do EURO. O gasto público feito nos PIGS para evitar a recessão e acabou deixando esses governos na corda bamba. Até hoje dependem do oxigênio fornecido por alemães e pelo norte da Europa para respirar. Nos momentos de maior tensão os PIGS quase arrastaram a Europa inteira com temores de dissolução da zona monetária e até mesmo expulsão de alguns países membro. Assim começou a grande crise que, por incrível que pareça, persiste ainda no mundo.
Ate hoje os juros na Europa e Japão estão longe de subir. Na Ásia como um todo também. As curvas de juros de Alemanha, Japão, Suíça, nórdicos entre outros seguem em território negativo. A atividade econômica tem desacelerado nos países ricos e nos emergentes. Os Eua despontam hoje como única economia grande e desenvolvida que cresce. O Fed sobe os juros. O mercado de trabalho americano está bem aquecido, com desemprego na casa dos 4%. A inflação preocupa. Os Eua podem sofrer as consequências econômicas do FED de Mr. Powell. Trump critica o FED pois a alta de juros coloca o dólar na máxima do ano contra a maioria das moedas do mundo. Trump quer competitvidade para a indústria americana e aumenta tarifas para protegê-las. A alta das tarifas traz custos inflacionários para os Eua, o Fed sobe mais ainda os juros, o dólar se valoriza ainda mais e tira competitividade dos produtos americanos. Essa será a dinâmica principal de 2019: fluxos de capitais se direcionando para a economia americana.
A questão chave nos EUA será o fim do ciclo de alta dos juros. O FED para em 3.0% ou vai a 3,5%? Quem vai ceder, o FED ou Trump? A economia americana vai desacelerar em 2019 a ponto de estancar o ciclo de alta dos juros? Um Fed mais duro castigaria mais os emergentes e uma postura mais dovish seria obviamente melhor para Brasil e demais emergentes. Os emergentes sofreram muito em 2018 com o movimento de alta de juros do FED. Os destaques negativos foram Turquia e Argentina. No Brasil teremos uma recuperação kaleckiana: os capitalistas gastam o que ganham e os trabalhadores ganham o que gastam. Algum otimismo criado com a eleição do novo governo estimulará decisões de gasto dos empresários, ainda que a capacidade ociosa continue elevada. Até mesmo os trabalhadores lentamente retomarão consumo, apesar dos níveis ainda altos de desemprego. Depois de anos de estagnação é possível imaginar um crescimento de 3% para o próximo ano no Brasil. Existe uma reversão a média e recuperação cíclica na economia. A bolsa no Brasil deve se beneficiar desse cenário de recuperação, mas não podemos dizer ainda se teremos apenas um voo de galinha ou algo mais sustentável. Câmbio por aqui deve ainda sentir pressão do cenário externo. Juros curtos devem seguir estáveis pois o nível de ociosidade ainda está muito elevado. Juros longos seguem dependendo da reforma da previdência e dinâmica fiscal.