Escrito com Rodrigo Medeiros, professor do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes)
Encontra-se disponível no Netflix a série “Uma Morte em Vermelho”, que versa sobre um dramático assassinato político ocorrido na Alemanha. A vítima foi um dos homens mais poderosos da Alemanha recém-reunificada: Detlev Rohwedder, chefe da Treuhandanstalt, a instituição responsável por reestruturar e privatizar as estatais da antiga Alemanha Oriental. O assassinato ocorreu no dia primeiro de abril de 1991, em Düsseldorf. Havia então um clima de insatisfação generalizada nos “novos estados” da Alemanha reunificada com o fechamento de centenas de milhares de postos de trabalho. Segundo consta na matéria assinada por Jean-Philip Struck, no site da Deutsche Welle, em 29 de setembro, a série “apresenta um extenso painel das tensões dos anos 1989 a 1991, lembrando que os primeiros anos após a Reunificação não são apenas compostos por alegres cidadãos dando golpes de picareta no Muro de Berlim”.
A responsabilidade pelo crime foi imputada à Fração do Exército Vermelho (RAF, em alemão), um grupo terrorista de extrema esquerda, conhecido fora da Alemanha como Baader-Meinhof. No entanto, a série levanta a suspeita sobre a responsabilidade do crime. O assassinato poderia ter sido cometido por agentes da Stasi (o serviço de segurança da Alemanha Oriental) ou por uma conspiração ligada a um suposto deep state da Alemanha Ocidental. Rohwedder deu início a um processo que culminaria na entrega de 94% das estatais da Alemanha Oriental para companhias e empresários ocidentais. O ressentimento popular faria com que não demorasse muito para que o extremismo de direita ressurgisse sobre as cinzas do socialismo real na antiga República Democrática da Alemanha (DDR, em alemão).
“À frente da Treuhand”, pondera a matéria publicada na Deutsche Welle, “Rohwedder teve que enfrentar intensos protestos de desempregados em frente à sede da instituição, instalada num prédio da antiga Berlim Oriental”. A série mostra como o próprio Rohwedder enxergava sua tarefa como um mal necessário diante do colapso iminente da economia dos chamados novos estados federais, defasados tecnologicamente. A união monetária não funcionaria bem com economias tão desniveladas. Era preciso acelerar os ganhos de eficiência e produtividade na antiga DDR, ainda que sob um elevado custo e trauma social. O pleno emprego era a realidade anterior na DDR, assim como a socialdemocracia era a realidade na República Federal da Alemanha (BRD, em alemão). Todo capital tecnológico desenvolvido pelo estado da DDR foi parar nas mãos da potências alemãs do ocidente.