Serviço nacional de aprendizagem industrial (SENAI): caso de sucesso na parceria Estado + Mercado na Indústria Nacional

*escrito por Tarcísio Romero de Oliveira para o BLOG

A educação é condição necessária, mas não suficiente, para o desenvolvimento industrial. Entretanto é importante lembrar que o Brasil possui um serviço educacional focado na formação de profissionais para a Indústria que é referência até hoje no mundo. Criado em 22 de janeiro de 1942 pelo Decreto-Lei no. 4.048, assinado por Getúlio Vargas, o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial, SENAI, teve suas atividades iniciadas em 28 de agosto de 1942 em São Paulo em uma escola no Brás, que recebeu posteriormente o nome do Engenheiro e Industrial Roberto Simonsen1. Como podemos lembrar, Roberto Simonsen e o economista liberal carioca Eugênio Gudin travaram um longo debate entre agosto de 1944 e agosto de 1945 sobre o papel do Estado e a necessidade ou não de se industrializar o país. Favorável  “A planificação do fortalecimento econômico nacional” que “deve, assim, abranger, por igual, o trato dos problemas industriais, agrícolas e comerciais, como o dos sociais e econômicos, de ordem geral”, Simonsen propunha diretrizes educacionais com a montagem de novas escolas de engenharia, institutos de pesquisas tecnológicas, industriais e agrícolas e a intensificação do ensino profissional2. Nada mais justo que essa escola tenha seu nome.

Como ainda não tinha know how em sua fundação o SENAI recebeu professores suíços e alemães para capacitar os docentes que formariam os trabalhadores da nascente indústria brasileira. Japão, Itália e Canadá também doaram equipamentos e o conhecimento para qualificação e entendimento das empresas industriais3. O Brasil, no pós segunda-guerra, soube aproveitar o momento de disputa política nascente entre os dois blocos políticos e militares principais (EUA e URSS) e seus aliados, e desse modo obter os recursos necessários para iniciar sua formação de capital humano4.

Nos anos 1970, já estabelecida, a instituição começou a transferir seu aprendizado aos países da América Latina. Em ações apoiadas pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e pelo Ministério de Relações Exteriores, por meio da Agência Brasileira de Cooperação (ABC), o SENAI ajudou na estruturação do Servicio Nacional de Aprendizaje (SENA), da Colômbia, e do Servicio Nacional de Adiestramiento em Trabalho Industrial (SENATI), do Peru, entre outros5. Hoje é um dos cinco maiores complexos de educação profissional do mundo e o maior da América Latina, tendo formado até 2020 mais de 73 milhões de profissionais em 28 áreas da indústria brasileira desde a iniciação profissional até a graduação e pós-graduação tecnológica. São 587 unidades fixas e 457 unidades móveis em todo o Brasil contando inclusive com 2 barcos escola, além de 331 laboratórios de serviço empregando 28.271 recursos humanos6.

Tal projeção foi reconhecida internacionalmente em 2019 quando o Brasil com sua delegação de 63 jovens conquistou o 3º lugar geral na WorldSkills 2019, mundial de profissões técnicas, realizado em Kazan, na Rússia. Destes, o SENAI treinou 56 participantes da equipe e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC) treinou os outros 7. Desde 2007 Brasil está entre os cinco melhores do mundo na competição, que ficou nesta última edição com a China em primeiro lugar e a Rússia em segundo7.

Mas o SENAI não se resume somente a educação. Existem 26 Institutos de Inovação, que trabalham com pesquisa aplicada para o desenvolvimento de novos produtos e soluções customizadas para as empresas. Os Institutos SENAI de Inovação já entregaram mais de 320 projetos, incluindo o FLATFISH, robô-submarino que faz inspeções de petróleo em águas profundas, e o gêmeo digital da plataforma P-50 que opera no campo de Albacora Leste, na Bacia de Campos8. Mais de 300 projetos estão em andamento, com um volume total de recursos de cerca de R$ 700 milhões.

Também contam com 58 Institutos de Tecnologia, que prestam serviços técnicos para aumentar a produtividade das empresas, garantir a qualidade de produtos e garantir a conformação com normas nacionais e internacionais. Cada instituto atende a setores específicos, de acordo com as características regionais das indústrias presentes em sua região. Como exemplos, a Escola “Armando de Arruda Pereira” em São Caetano do Sul-SP tem uma planta totalmente robotizada e equipes focadas em Manufatura Discreta9, já a Escola Ettore Zanini em Sertãozinho-SP tem uma planta de fermentação e uma destilaria, totalmente automatizadas com software e hardware de última geração, focada na Indústria de Processos e Energias Renováveis10. Alunos e empresas compartilham o mesmo espaço, testando novas tecnologias e estando assim plenamente capacitados para os desafios da Indústria 4.0.

A instituição é um excelente exemplo de planejamento nacional, coordenação conjunta entre Estado e Iniciativa Privada com a constante auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) que verifica custo hora-aluno, atualização constante dos currículos utilizados nos Itinerários Formativos Nacionais, incorporação da Metodologia Senai de Educação Profissional nos processos de ensino e a instituição de programa de valorização dos professores do Sistema SENAI11. Com um exemplo brasileiro tão bem-sucedido e pujante (apesar de todos os ataques que vem sofrendo12) de planificação e ação combinada Estado/Iniciativa Privada, fica a pergunta: onde “desaprendemos” a nos industrializar, e como podemos retomar esse caminho antes que percamos toda essa história e aprendizado como o do SENAI?

Referências:

2 thoughts on “Serviço nacional de aprendizagem industrial (SENAI): caso de sucesso na parceria Estado + Mercado na Indústria Nacional”

  1. Excelente texto, que deveria ter a mais ampla divulgação possível, principalmente, entre espíritos míopes que se orientam por ideologias sem qualquer contato com o mundo real. A pergunta pertinente deveria ser: o que precisamos fazer para retomar o rumo perdido da construção de uma Nação Decente voltada para o Bem Comum?

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